RESISTIR É PRECISO...

Vivemos tempos de profundo retrocesso na Educação. O movimento neotecnicista nos impõe economistas e burocratas como "gestores" de uma educação bancária, excludente e perversa... resistir é preciso.

segunda-feira, 24 de janeiro de 2011

PROMOVER O SUCESSO OU ADIANTAR O FRACASSO?

Estava relendo alguns textos produzidos na década de 80, quando as ideias de Vigotsky e os trabalhos de Emília Ferreiro alimentavam nossas discussões sobre a necessidade de, após décadas de tecnicismo, onde toda prática docente girava em torno do como fazer - métodos e procedimentos - refletirmos sobre os processos de aprendizagem, de como as crianças aprendem... estas lições se não foram esquecidas, vem sendo irresponsavelmente ignoradas pelos gestores e suas políticas públicas, assim como simplesmente engolidas por professores que não se dão mais ao trabalho de questionar política alguma.
Se lutávamos para que o ensino Fundamental aprendesse com a Educação Infantil e se tornasse mais interdiciplinar, mais lúdico, mais vivo e concreto, mais respeitoso com a infância e seus tempos e processos, assistimos infelizmente o inverso: as práticas mecanicistas, o ensino fragmentado, aligeirado, superficial e inútil, livros didáticos e materiais - mesmo com o disfarce moderno das novas mídias - para o treinamento, adestramento e memorização.
Apesar de tantos trabalhos produzidos mostrando a especificidade do tempo que chamamos infância, apesar da multiplicidade de infâncias vivenciadas pelos diferentes sujeitos em diferentes espaços, hoje o que assistimos é a lógica fabril invadindo as nossas escolas e alistando nossas crianças em suas linhas de produção.
Cada vez mais esquecido o direito de "brincar" - garantido pelo tão ignorado ECA - cada vez mais esquecido o respeito a infância em suas especificidades, em nome de um certo "preparo" para uma "vida produtiva". Cada vez mais o ensino fundamental e seus fazeres invadem a educação infantil cobrando uma ação mais produtiva que garanta a tal "alfabetização" o quando antes, para afastar o medo do fantasma do fracasso escolar. Qual alfabetização? Experiências vivas com a lingua? Cantar, ouvir e contar histórias? Descobrir o encantamento da palavra? Não, claro que não!!! Isso é perda de tempo. Vamos trazer dos porões da história da educação os exercícios de prontidão, as caligrafias, as cópias... precisamos alfabetizá-los! Vamos parar com essas bobagens pedagógicas inventadas por esses pedabobos e vamos fazer o que "todo mundo" sabe que é bom e que funcionava... esquecendo, claro, que funcionava para 1 criança em cada 100 ou em cada 1000 e que produziu um exército de adultos analfabetos expulsos pela escola que funcionava para "todo mundo". Esquecendo de tudo que foi dito e escrito por Paulo Freire e tantos outros.
Vamos caminhar outra vez pelas mesmas velhas estradas que não nos levaram a lugar algum. Ou melhor a esse lugar vergonhoso que estas mesmas políticas públicas produziram ao longo dos anos neste país.
Mas desta vez não vamos esperar que eles tenham 07 ou 06 anos para dizer que não prestam para estudar, que não possuem "bagagem cultural", que são doentes, desnutridos, hiperativos, anormais, degenerados. Para que esperar?! Vamos começar pressioná-los com 04 ou 05 anos com nossos "trabalhinhos" e "provïnhas" para separar logo o joio do trigo. Vamos identificar logo os desajustados, os casos difíceis, os doentes! Vamos compará-los logo com nossos filhos, tão espertos, tão sabidos, tão desenvolvidos... e constatar comovidos, que não adianta fazer por essa gente: eles não tem jeito mesmo!!! 
Querem acabar de vez com a Educação Infantil e transformá-la em um cursinho preparatório para a alfabetização, mas não a alfabetização plena que forme um leitor do mundo e das palavras, que forme um autor e um cidadão, mas uma alfabetização mecânica, restrita e ineficiente, a mesma que já produziu tanto fracasso. Adiantar essas práticas, castrando, ajustando e ferindo nossas crianças, desde cedo, com suas lógicas competitivas, mercadológicas e todos que tem memória histórica sabem - inúteis - não promoverá o sucesso dos pequenos, não garantirá sua alfabetização até os 08 anos, irá no máximo, adiantar os discursos de fracasso sobre estes sujeitos, dilacerando sua autoestima em uma idade ainda mais vulnerável, tornando tudo isso apenas um pouco mais perverso do que já é feito há tantos e tantos anos neste país.